Disciplina com flexibilidade

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Disciplina com flexibilidade

A disciplina

Como boa capricorniana, adoro disciplina, ordem, cada coisa em seu lugar. No entanto, sempre pratiquei a disciplina inflexível, sabe como é? Aquela cheia de ‘tem que’, ‘tenho que’, ‘devo’, ‘preciso’; imagino que você tenha captado a ideia. Uma disciplina tão rígida que está fadada a frustações, já que normalmente ela vem junto com padrões e expectativas muito altos, difíceis mesmo de serem cumpridos.

Inspiração

Outro dia, fazendo uma maravilhosa aula de yoga da Pri Leite, o tema era “Disciplina com flexibilidade”; confesso que foi uma das melhores aulas que já fiz porque o tema trouxe um insight que me fez repensar minhas posturas, não somente no tapetinho mas também em relação a tudo o que me proponho a fazer. Por exemplo, não sei dizer quantas vezes vi uma determinada postura e decidi que queria fazê-la corretamente, forcei, exigi do meu corpo, desafiei a mim mesma, mas faltava a sensibilidade para perceber que o processo deveria ser gradativo até chegar na postura correta. Em outras palavras, o meu foco era o objetivo, a postura, mas eu deixava de perceber que o processo era importante, que havia vários estágios a serem percorridos. Lembra do ditado que diz que o caminho é mais importante do que a chegada? Pois então, embora já tenha ouvido isso incontáveis vezes, não percebia o quanto ele é verdadeiro.

Agora, levando esse momento de aprendizado para a vida, quantas vezes decidi que queria algo, focava no objetivo, na chegada, e esquecia da jornada? Você já sentiu e passou por isso? Consegue perceber o quanto exigiu do seu corpo e da sua mente porque ‘tinha que’?

Onde entra a flexibilidade

Vamos fazer um paralelo. Já fez alguma postura de yoga? Já tentou algo simples como a Postura da Montanha (Tadasana) que é ficar parado, em pé, com os pés juntos. Simples, não é mesmo? Mas não se deixe enganar, uma postura aparentemente tão simples pede atenção, presença, observar se é necessário no início deixar os pés um pouco afastados e ir ganhando equilíbrio, não projetar os quadris, relaxar os ombros, como muitos professores de yoga dizem “seu ombro não é brinco, descola ele da orelha!”. Olhe o caminho que leva ao objetivo. Esse processo de observação e descoberta das pequenas correções a serem feitas oferece um aprendizado riquíssimo e pede flexibilidade. Flexibilidade para perceber que talvez no primeiro dia seus pés ficarão afastados, que o quadril quer se projetar ou mesmo que se fechar os olhos perderá o equilíbrio. Você não acha incrível perceber essas pequenas coisas que, caso não esteja presente, passarão despercebidas?

Agora vamos complicar um pouquinho, a postura da Árvore (Vrksasana) onde você fica em pé, com a planta de um dos pés apoiada na coxa da outra perna, formando uma espécie de número 4. Dificilmente a primeira vez que você fizer essa postura conseguirá posicionar a planta do pé muito alto, será uma evolução gradual, começa lá embaixo, pouco acima do tornozelo e vai galgando o caminho até o alto da cocha.

A flexibilidade está justamente em perceber essas pequenas evoluções, as correções, a insistência, sem agredir seu corpo, sem forçar. Talvez essa seja a ideia de que mais gosto no yoga, fazer a prática no seu ritmo, respeitando seu corpo.

Manter a motivação

Quando você consegue equilibrar a disciplina para o que deseja realizar com a flexibilidade para fazer os ajustes necessários, ganha mais consciência de que é tudo uma evolução. Se não pensar assim, perderá o ânimo por conta dos desafios envolvidos no seu objetivo, ficará a espera de resultados rápidos, entrará no ciclo do ‘tenho que’, ‘tem que’.

Disciplina e rigidez

A combinação da disciplina com rigidez não leva você muito longe ou cobrará um preço alto demais. No livro Desiging your Life, Bill Burnett e Dave Evans falam que a “verdadeira felicidade vem de criar uma vida que funciona para você” e vão além dizendo que não existe apenas um plano ideal para sua vida, que não existe apenas uma solução, mas sim várias delas e tu-do-bem. Se ainda não leu esse livro, recomendo.

Veja, esse conceito do que funciona para você é justamente a flexibilidade alinhada ao autoconhecimento.

“A vida é um processo, não um resultado. Abrace as falhas, as fraquezas, os enormes problemas e todas as coisas que aconteceram sobre as quais você não tem o menor controle. Elas são o que fazem a vida valer a pena.”

— trecho do livro Designing your Life

O caminho do meio

Voltando ao exemplo da postura da Árvore, a percepção dos ajustes e correções a serem feitos mostra que o segredo está no equilíbrio entre disciplina e flexibilidade, gradual. Disciplina para trazer consistência para qualquer mudança que você queira fazer, pode ser aprender um idioma, praticar uma atividade física, mudar ou criar um hábito, praticar uma nova forma de se alimentar, começar a fazer jejum intermitente; ser disciplinado para se comprometer a incluir as tarefas necessárias em sua rotina.

Agora é a flexibilidade que irá te ajudar a ajustar essas mesmas tarefas à sua realidade. Por exemplo, você programou sair para correr pela manhã, assim que acordasse; mas não dormiu bem à noite, seu corpo está cansado e você está desatenta. O que fazer?

Um pensamento rígido dirá “Você se comprometeu, então vá correr” ou se for rígido e sentir-se vítima das circunstâncias, soará mais como “Justo hoje que decidi correr, não durmo bem à noite”.

Um pensamento flexível dirá “Certo, não estou bem para correr, vou caminhar”. A mudança aqui foi para algo que não exigirá tanto de você, que não será pesado.

Consegue imaginar outras ideias mais flexíveis para esse cenário?

Por exemplo:

  • mudar o horário da atividade para o fim do dia
  • mudar o tipo de exercício

Como pode ver, você continua disciplinada, mas ajustou seu compromisso ouvindo seu corpo e a sua realidade.

“Uma parte importante do processo é se desapegar — de sua primeira ideia e de uma solução boa, mas não ótima. E às vezes designs incríveis podem surgir da bagunça. O Slinky foi inventado desta forma. Teflon foi criado desta forma. Super cola. Play-Doh. Nenhuma dessas coisas existiria se um designer em algum lugar não tivesse estragado tudo. Quando você aprende a pensar como um designer, aprende a estar ciente do processo. O design de vida é uma jornada; deixe de lado o objetivo final e concentre-se no processo e veja o que acontece a seguir. “

— trecho do livro Designing your Life

Ouça o seu corpo

Acredito que o maior ganho desse processo de disciplina com flexibilidade é conseguir escutar o que nosso corpo nos diz, entender nossos limites no momento presente. Lembro que no início da pandemia algumas alunas comentavam sobre a dificuldade de conciliar o trabalho de casa e os filhos que queriam atenção uma vez que os pais estavam ali do lado.

Essa situação gerava um desconforto em minhas alunas, porque uma parte dizia que tinham que estar ali, desfrutando do tempo com os filhotes, enquanto outra parte dizia que tinham que trabalhar. Esse diálogo mental rouba a produtividade e a entrega à atividade que você faz, é como se não estivesse de corpo e alma na tarefa presente.

Como trabalho de casa há mais de 15 anos, lembro bem como foi o ajuste desse equilíbrio quando meu filho era pequeno, ele queria atenção e eu preocupada com prazos e cotas de trabalho. Mas resolvi ouvir meu corpo, nesse caso meu coração que dizia que eu não poderia perder esse momento com meu filho. O resultado foi incluir pequenas interrupções no trabalho durante o dia, nós brincávamos que era o ‘momento do abraço’, onde corríamos (literalmente) até a cama dele ou a minha e ficávamos abraçados por 5 minutos, conversávamos, ríamos e voltávamos ao que tinha para fazer. Você que também é pai ou mãe, certamente concordará comigo que não existe nada mais delicioso do que o abraço do filho. Nossa vibração aumenta instantaneamente e para a criança a sensação de proteção, carinho e amor também eleva a vibração e melhora todo o sistema imunológico. Não é maravilhoso?

Eventualmente eu incluía atividades mais longas como um jogo depois do almoço, pintar, desenhar, montar Lego. E onde entra a disciplina com flexibilidade? Eu sabia que não faria o horário de trabalho normal, que estenderia meu horário e tudo bem.

Esteja presente

Sei que já falei aqui diversas vezes sobre estar presente, estar atenta ao momento e ao que se está fazendo, mas vou me repetir. Quando você escuta seu corpo e seu coração e traz sua atenção para o agora, se torna mais produtivo e entregue. Consegue notar se está exigindo demais do seu físico, seja por longas horas de trabalho sem pausa ou porque sente que devia estar fazendo outra coisa, como lavar a louça, comprar a carne para o jantar, o que seja; sua atenção fica dividida, pouco produtiva.

É a combinação da energia no agir e a entrega ao momento presente que traz mais resultados.

E você

Talvez você, como muitas outras pessoas mundo afora, tenha traçado planos para esse ano e estipulado metas a serem alcançadas. Então, deixo aqui um convite para que seus planos sejam uma combinação de disciplina e flexibilidade.

Acredito que precisamos de metas para sairmos de nossa zona de conforto e estarmos sempre em constante movimento, expandindo, expandindo; mas que elas não sejam rígidas a ponto de causar desânimo, frustração. Comprometa-se com o que se decidiu a fazer, mas aceite que precisará de ajustes e que não há nenhum mal nisso.

No fim desse ano, que tal você voltar aqui para me contar se conseguiu colocar essa ideia em prática? Eu adoraria saber como foi essa experiência para você.

De minha parte, farei o mesmo.

Abraço

Flor sem fundo

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